A imprevisibilidade, o divino e os algoritmos, por Luís Moniz

Joao GeraldesNotícias Leave a Comment

Se as componentes analíticas – algoritmos, inteligência artificial, etc – podem aumentar racionalmente o nosso conhecimento e detectar novas opções, logo, diminuímos a imprevisibilidade. Mas só aparentemente.

Tropecei em vários textos e vídeos de Idris Jala, ex-CEO da Malaysia Airlines entre 2005 e 2009, a quem foi atribuída a responsabilidade de ter resgatado a companhia aérea da falência. Há oito anos que é ministro sem pasta do Governo malaio.

Nas palestras que faz pelo mundo, fala dos seis factores para a transformação das organizações. Os cinco primeiros aprendem-se numa qualquer escola de gestão. Resultam de boas práticas e sobretudo do bom senso, não constituindo, portanto, grande novidade. A busca do impossível, ou seja, passar a nossa zona de conforto, gerir com métricas para os resultados, desenvolver acções concretas no terreno e não se ficar apenas no plano teórico de acções, exercer liderança nos projectos e construir parcerias e redes de colaboração. O que Idris Jala traz no sexto factor é radicalmente novo em termos de gestão: aceitar a intervenção divina. O divino – para Jala – manifesta-se através da nossa impotência. Por muitos recursos e competências que tenhamos nunca serão suficientes para explicar a complexidade do que se passa à nossa volta. A imprevisibilidade é a norma porque assenta em dois paradigmas: o primeiro é que não temos controlo nem influência na maioria dos acontecimentos. Nassim Taleb, no livro “Cisne Negro”, defende que a maioria dos eventos que verdadeiramente são importantes (internet, 11 de Setembro, etc.) nunca foram previstos, apesar de “a posteriori” tentarmos justificá-los. Segundo, ao longo da nossa vida pessoal e das organizações vamos reduzindo o número de opções. 

O nosso desígnio é aumentar as opções e reduzir a imprevisibilidade. Se as componentes analíticas – algoritmos, inteligência artificial, entre outros – podem aumentar racionalmente o nosso conhecimento e detectar novas opções, logo, diminuímos a imprevisibilidade. Mas só aparentemente. Como o ritmo de crescimento dos dados (“big data”) é maior do que a nossa capacidade de descobrir o que eles significam, o desconhecido supera a dimensão do nosso conhecimento, ou seja, aumentamos a imprevisibilidade e consequentemente diminuímos as opções. Mesmo assim, muitos dos algoritmos residem em modelos estatísticos logo com algum teor de incerteza.

O curioso da abordagem em Jala é que o aumento da certeza e das opções é feito pela intervenção divina através de três acções: nos valores e nas acções que nos levam a sermos boas pessoas; na ética da organização e das pessoas que levam a evitar o mal e por fim à reflexão e ao recolhimento temporário que nos levam a perceber onde estamos e para onde queremos ir. Acções impossíveis – felizmente – de serem traduzidas em algoritmos.

Nota: O autor não aderiu por vontade própria ao convencionalismo do recente acordo ortográfico.

Responsável de Marketing no SAS Portugal

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